sábado, 26 de abril de 2008

O perigo de uma visão maniqueísta




"Mankind must come together to fight such dark impulses.The civilised world must never forget".
(George W. Bush)


Está correndo na internet um e-mail relatando a frase do ex-presidente dos Estados Unidos Eisenhower sobre a necessidade de se documentar os horrores da Segunda Guerra para que o mundo não se esqueça do que ocorreu durante o holocausto, pois “algum idiota, ao longo da história, se erguerá e dirá que isto nunca aconteceu”. O e-mail ainda cita Edmund Burke para reafirmar a importância de seu argumento: “Tudo o que é necessário para o triunfo do mal, é que os homens de bem nada façam”.
As frases são boas, mas a forma como foram contextualizadas ao longo da história é um pouco assustadora, pois há uma visão predominante sobre a Segunda Guerra: a de que tudo ocorreu porque Hitler era mau e só não foi adiante porque os norte-americanos (que entraram em 1941), com a ajuda de seus aliados, interferiram e fizeram o papel do “homem de bem”.
O holocausto existiu e foi horrível, mas Eisenhower está longe de ser uma pessoa “do bem”. O país que mais lucrou com a Segunda Guerra Mundial foram os Estados Unidos, durante e depois desta. Foi nela que os filhos do Tio Sam se impuseram definitivamente como superpotência mundial (ao lado da União Soviética).
Hitler teve todos os defeitos do mundo e estes já foram incessantemente discutidos, porém pouco se discute o que fez com que uma pessoa como ele chegasse ao poder, quais eram as condições da Alemanha quando o ditador assumiu o comando.
1. Com o fim da Primeira Guerra, a Alemanha perdeu 1/7 do seu território: a França teve de volta a região da Alsácia-Lorena, e a Bélgica anexou os cantões de Eupen e Malmedy. A Polônia ganhou parte das Prússias (Ocidental e Oriental) e da Silésia Oriental. A Tchecoslováquia ficou com um pedaço da Silésia Superior e a Dinamarca com uma parte de Schleswig. Enfim, o país da cerveja ficou mutilado territorialmente.

2. Os alemães também tiveram de abrir mão de suas colônias e ficaram proibidos de se unir com a Áustria.

3. O país de Goebbels teve de desmilitarizar seu exército.

4. O marco, moeda alemã, estava totalmente desvalorizado perante o dólar por causa dos pagamentos compulsórios da perda da guerra.

5. O desemprego passou de 3 milhões com a crise.
Se houve depois um breve período de prosperidade, este foi dilacerado pela crise da bolsa de Nova Iorque, em 1929. E, com certeza, esta segunda crise preparou o terreno para Hitler assumir o poder. Para se ter uma idéia, quando o führer assumiu a Alemanha, o país já tinha dobrado o número de desempregados (6 milhões).
E o chefe do Estado alemão, o que fez quando chegou ao poder? Será que foi apenas a propaganda de Goebbels que o fez ter tanto apoio popular? Abaixo vai um breve resumo da transformação feita por ele na Alemanha:
1. Incentivo à questão da pureza da raça que, por mais rascista que seja, na época, representou uma valorização da cultura e, logicamente, do povo alemão, levantando a sua auto-estima.

2. Recuperação do exérico alemão, mais uma atitude para levantar a moral do país (além de defender a soberania). Resultado: A remilitarização da Alemanha impulsionou o país. Os empresários, com exceção de Schindler, apoiaram a iniciativa e foram apoiados pelo Estado (inclusive Schindler).

3. Diminuição do desemprego: Em três anos de governo, o desemprego caiu de 6 milhões para menos de um milhão e a economia foi recuperada.

4. Anexação da Áustria: Desobedeceu o Tratado de Versalhes, saiu da Liga das Nações e anexou o país vizinho. Detalhe: entrou sendo ovacionado pelo povo austríaco. Para se ter uma idéia, houve um referendo popular para discutir a anexação e o resultado foi de 99% de aprovação. Além disso, recuperou a região da Renânia.

5. Anexou a parte sul da Tchekoslováquia, pois ali viviam 3 milhões de alemães. Foi atrás de seu povo.

6. Tornou o país auto-suficiente em gasolina e borracha.

7. Vale lembrar que NAZI é o modo como eram chamados os nacionais-socialistas na Alemanha. Ou seja, Hitler era nacionalista.

O ditador não era corrupto, pelo contrário. Acreditava em seus ideais, por mais destrutivos e sombrios que tenham sido. Tanto que levou um tiro durante a Primeira Guerra, se curou e pediu para voltar à frente de batalha. O cara estava disposto a dar vida pelo país dele. Não há o ditado “América para os americanos”? Então, Hitler governou, literalmente, para os alemães.
É difícil concordar com os métodos utilizados pelo führer para levantar o país germânico, mas não dá para querer esconder um camelo atrás de uma agulha; não dá para escrever sobre o holocausto sem mostrar os porquês que o motivaram. Uma análise crítica deve levar em conta os dois lados.
Einsenhower estava certo em relação à lembrança contínua do holocausto, mas na guerra não existe essa dicotomia bem e mal. O que os Estados Unidos fazem hoje é a mesma coisa que Hitler fez, aliás, a expansão territorialista dos Estados Unidos começou quando invadiram o México, em 1848, incorporando o Texas, a Califórnia e o Novo Mexico. Em 1853, foi anexada mais uma faixa ao sul do Novo México e a oeste do Rio Grande.
Uma frase do ex-presidente Roosevelt, dita em 1901, resume o que se está afirmando, pois é seguida a risca até hoje: "Fale macio e use um porrete". Isso sem falar na famosa frase da Doutrina Monroe: "América para os americanos" que significou o intervencionismo, inclusive militar, dos yankees na América Latina.
Se as pessoas querem realmente que horrores como os da Segunda Guerra não ocorram, elas devem analisar os fatos a partir do nascimento de suas causas. Em relação à discussão sobre ascensão do nazismo e as suas conseqüências, ficou estabelecido que se deve discutir apenas uma visão, a vencedora. Inclusive, quem mostrar o outro lado pode ser tachado de fascista, nazista, etc. É uma moral hipócrita, acrítica e burra. E esta atitude, esta aceitação dos fatos sem analisá-los de modo criterioso é o maior perigo para que uma Terceira Guerra ocorra, pois traz aceitação pública para os atos expansionistas norte-americanos.
Os Estados Unidos invadiram o Iraque e o Afeganistão com argumentos que foram caindo um a um. Passou por cima da ONU, que não aconselhava a invasão desses países (como Hitler o fez em relação à Liga das Nações), e tudo em nome da liberdade, de uma suposta guerra contra o terrorismo contra o “império do mal”, segundo palavras do próprio Bush.
Tomando como inspiração a atitude de Eisenhower, não se deve esquecer a frase de Roosevelt, pois algum idiota irá dizer que ela nunca existiu e levará o imperialismo estadunidense adiante.Então, para os esquecidos, aí vai novamente:"Fale macio e use um porrete".

2 comentários:

Prof. Carlos César de Oliveira disse...

Eu já conhecia este texto. Penso que o conteúde dele é bastante propicio para o momento, uma vez que os Estados Unidos passa por uma eleição bastante disputada entre dois opositores da política internacional defendida em todo o mandato do presidete Bush. Você, como sempre, muito feliz em suas colocações, Felipe.

Prof. Carlos César de Oliveira disse...

Eu já confecia o referido texto. Acho extremamente importante levantar este assunto uma vez que os Estados Unidos passa por uma crise de identidade. Presenciamos uma disputa eleitoral apenas no lado da opisição. A política internacional defendida pelo presidente Bush durante todo o seu mandato fez com que o povo norte-ameircano se posicionasse contra qualquer tido de guerra ou invasão. Como sempre você - Felipe - se posicionando acertadamente. Um grande abraço.